Livros: Primavera num espelho partido

 

 

Livros/Primavera num espelho partido
Mario Benedetti¹






Durante a década de 1970, em plena ditadura uruguaia, uma família composta de pai, mãe, filha e avô contam a separação devido à prisão do primeiro. Completando a narrativa está um amigo e o próprio autor.
Santiago é o pai, que permanece preso no Uruguai e escreve cartas para a família que está na Argentina. É ele o primeiro personagem apresentado, mas não é o único responsável por toda a mudança na vida familiar, visto que a sua esposa também era militante.


Em terras Argentinas estão os demais personagens, como a mãe Graciela e a filha Beatriz. Mesmo juntas, existe uma distância entre elas, como o fato de Beatriz só chamar Graciela de mãe quando deseja agradá-la.
Narrado em terceira pessoa, a parte de Graciela mostra uma mulher forte, que trabalha e agora se vê cheia de dúvidas com a longa separação. Ao mesmo tempo é a responsável pela parte mais inverossímil do livro.


Já a narrativa da menina Beatriz é uma das mais agradáveis, e ao mesmo tempo reais em relação aos personagens. Sua visão está na saudade e nas mudanças, no que ela percebe e no que ela imagina, rendendo alguns momentos cômicos na história.
O pai de Santiago, Don Rafael, compartilha com o leitor suas dúvidas, histórias e culpas. Entre a nostalgia e a atualidade, parece que as cartas acabam aproximando mais pai e filho, já que aqui também há um distanciamento parental.
Fechando o quinteto temos o amigo Rolando Asuero, o solteirão da turma que dá uma ideia de como era o antes de todos os seus companheiros se separem, sejam pela prisão, pelo exílio ou pela morte.


Entre os personagens, o próprio Mario divide as suas histórias do exílio, que junto com os capítulos de Beatriz são os mais interessantes. Neles estão suas mudanças de país, as pessoas que encontrava pelo caminho, as mudanças que aconteciam em Cuba em uma visão apaixonada que o socialismo de Che provocava na época.


Mario Benedetti muda o estilo narrativo conforme o personagem, mais do que alterar entre primeira e terceira pessoa, está o uso de cartas – recurso que eu vi sendo utilizado por Amós OZ em seu maravilho "A caixa-preta"), ou apenas contando o que está acontecendo – recurso utilizado em outro livro que eu acho muito interessante chamado Meu Nome é Vermelho de Orhan Pamuk.


O problema é que esta mistura de recursos não é muito fácil para o leitor e creio, que nem para o escritor, já que a história ficou superficial demais mesmo tendo um tema tão tenso e que até hoje provoca acaloradas discussões.
Um exemplo é a própria apresentação dos personagens, logo de início você não sabe sobre quem está sem falando, fica-se perdido tentando encaixar as peças e tornando a pouca intensidade da história secundária.
Digo pouca intensidade pelo fato de que a falta de detalhes acaba não criando laços e sim muito mais perguntas sobre eles, parecendo tudo muito ensaiado, sem paixão na escrita. Por isso assumo que apenas literaturei Primavera num espelho partido, que mesmo de leitura rápida não me provocava o desejo de saber o que viria a seguir.


Primavera con una esquina rota
Mario Benedetti
Tradução: Eliana Aguiar
2009 – 238 páginas
Primavera num espelho partido


1-Mario Benedetti


Nasceu em Paso de los Toros, a 200 quilômetros ao norte de Montevidéu, em 14 de setembro de 1920. Sua família mudou-se para Montevidéu em busca de uma vida melhor. O pai, farmacêutico, perdera tudo o que possuía.

Aos 8 anos Benedetti ingressa no Colegio Alemán – uma instituição reconhecida pela sua qualidade – até o início do nazismo, quando seu pai, contrário a esse regime, o transfere para outro colégio. Essa experiência pode ser conferida no livro Gracias por el fuego (1965), no qual o personagem Ramón Budiño relata os castigos que recebeu quando estudava no mesmo Colegio Alemán.

Entre 1938 e 1941, Benedetti reside a maior parte do tempo em Buenos Aires e, em 1945 passa a integrar a redação do celébre semanário Marcha – sua grande escola de jornalismo –, onde permanece até seu fechamento, em 1974. Também em 1945 publica o primeiro livro de poemas, La víspera indelible, que nunca foi reeditado.

Em 1946, após alguns anos de noivado, se casa com Luz López Alegre, sua companheira durante toda a vida. E, nos anos seguintes, se alterna na direção das revistas literárias Marginalia e Número. Em 1948 publica o volume de ensaios Peripecia y novella e, um ano depois, seu primeiro livro de contos, Esta mañana.

Seu primeiro envolvimento político ocorre no ano de 1952, quando participa ativamente do movimento contra o Tratado Militar com os Estados Unidos. No ano seguinte publica Quién de nosotros, seu primeiro romance. A primeira viagem à Europa ocorre em 1957 – Benedetti visita então nove países como correspondente de Marcha e El Diario. Em 1959 aparece o volume de contos Montevideanos, peça chave de sua narrativa de concepção urbana e local. Um ano depois publica La tregua, seu romance mais conhecido, e El país de la cola de paja, um ensaio sobre a crise pela qual seu país atravessava.

Em 1965, mesmo ano de Gracias por el fuego, começa a escrever críticas cinematográficas para o jornal La tribuna popular. Logo depois vai a Paris, onde fica por um ano. Em 1967 publica Letras del continente mestizo, no qual reúne ensaios e artigos sobre literatura latino-americana. Em 1971 funda o Movimiento de Independientes 26 de Marzo, um grupo que passou a formar para da coalizão de esquerda Frente Amplio.

O golpe militar no Uruguai em 1973 o obriga a abandonar sua pátria. Parte para o exílio e passa por diversos países (Argentina, Peru, Cuba) até chegar na Espanha. Após longos dez anos, retorna a Montevidéu, e passa a fazer parte da diretoria da nova revista Brecha – continuação do projeto da revista Marcha.

As publicações se sucedem: Con y sin nostalgia, (contos) e La casa y el ladrillo (poemas), de 1977; Pedro y el Capitán (teatro), de 1979; y Cotidianas (poesia); Viento del exílio (poesia), de 1981; Primavera con una esquina rota e Cuentos, de 1982; Yesterday y mañana (poemas), de 1988; Despistes y franquezas (contos), de 1989; Las soledades de Babel (poemas), de 1991; La borra del café (romance), de 1993; Canciones del más acá, de 2000; Insomnios y duermevelas, de 2002. Neste ano recebe o título de cidadão honorário de Montevidéu.

Morreu em 17 de maio de 2009, aos 88 anos.